sábado, 26 de fevereiro de 2011

A bioética segundo Franklin - I

Bioética: ponte para o cuidado

A expressão, “bioética: ponte para o futuro”, cunhada por Potter (1971) pode ajudar na construção
de uma imagem que açambarque a bioética evidenciando a que ela se propõe. A imagem de uma
ponte! Não frágil, mas flexível porque feita de cordas (princípios da bioética) e madeira (natureza
da bioética). Para livrar a humanidade do precipício (colapso ou destruição) que as intervenções do
ser humano podem provocar. Além disso, para conduzir ao futuro mais seguro.

A bioética é de natureza “relacional”, pois está preocupada não só com o modo como as relações
entre ser humano e realidade se estabelecem, mas também com o impacto dessas mesmas relações
no próprio ser humano e no meio ambiente. Criar um espaço de relação dialogal onde todos os que
estão envolvidos no processo de produção, aquisição e manipulação do conhecimento que incide
sobre a realidade, faz parte da natureza da bioética. Por isso, as tábuas dessa ponte são a natureza
dialógico-relacional da bioética. Dá firmeza.

Este diálogo-relação que orienta a ação de uso fruto da realidade se estabelece com base em
princípios. A madeira da ponte precisa de cordas que entrelaçadas dão sustentabilidade a ponte. Os
princípios são estas cordas! O princípio do benefício ou de não malefício: fazer o bem e prevenir
o mal; o princípio de autonomia: respeito aos direitos do ser humano que pode decidir sobre o
tratamento aplicado e o princípio da justiça: igualdade de tratamento e distribuição do conhecido.
Atravessar esta ponte exige equilíbrio!

Criar um equilíbrio nesta dinâmica não-retroativa do conhecimento que domina a realidade no
intuito que produzir melhorias na e para a vida, parece ser este o objetivo da bioética. Tal equilíbrio
faz surgir uma ética do cuidado na qual os princípios da dominação, consumismo e financeiros são
substituídos pelo bem do outro, pela autonomia do outro e pelo direito do outro. Mas este outro está
inserido numa comunidade!

O desenvolvimento das tecnociências nos faz perceber esta ponte – bioética – balançando sobre
o abismo da destruição e nos levando do extremo da tecnofilia e tecnofóbia ao lugar seguro do
cuidado com os outros e o meio ambiente.

Franklin Alves Pereira

3 comentários:

Valentina disse...

Esta belíssima metáfora me lembrou uma poesia de Erri de Luca, escritor contemporaneo da minha Italia.A poesia titula "diga", i.é., barragem e conta a morte de muitos como consequencia da ruptura de uma barragem.Cito só um pedacinho:
"... Ascolta il tuffo del sangue quando l´amore stringe:
moltiplicalo per il quadrato delle stelle fisse,
per il grido del capretto sgozzato ogni Pasquanatale,
per la sega del fulmine e il piccone del tuono, aggiungilo agli schianti del bosco cancellato,
larici, abeti, càrpini, betulle, cervi, gufi, lepri, martore, uova, ali, zampe, artigli stritolati: e poi dividi
per il silenzio di un minuto dopo. Non giocare con l´acqua, non chiuderla, frenarla, è lei che scherza dentro le grondaie, turbine, ponti, risaie, mulini, vasche di saline.
É alleata con il sottuosuolo, ha catapulte, macchine d´assedio, ha la pazienza e il tempo:
passerai pure tu, specie di vicerè del mondo,
bipede senza ali, spaventato a morte dalla morte
fino a metterle fretta". (Erri de Luca, Opera sull´Acqua)
A ponte, assim construida, inspira-me segurança e flexibilidade... uma sensação bem diferente da aparente firmeza de estruturas que violentam a natureza. Segundo de Luca, esta violenza é gerada pelo medo da morte que faz do ser humano "amedrontado a morte pela morte até pôr-lhe pressa" vítima de si mesmo. Mas também o diálogo do qual Frankin fala pede certa violência: a doce violência da escuta mútua, da paciência. Lendo o livrinho da campanha da fraternidade eu pensava: estaremos dispostos a esta "violência" chamada renúncia? A esta partilha chamada sobriedade?

Germano SJ disse...

Só para contrapor as idéias, Valentina. Em "Ética e espírito" Levinas, depois de analisar a política, a religião e mesmo o ser tomado pela "musa" do artista, diz que a única manifestação humana que não violenta é a ética... o espírito... a palavra não violenta, argumenta, convence, adverte...

Valentina disse...

Germano, você me faz pensar... penso à minha experiência com a práxis e a ambigüidade de uma vivência entre o dever, e a "violência" que implica a força de vontade, e o desejo de uma "conversão do desejo" que passa pelo que você disse: argumentação, convencimento, educação, etc. Não sei se este é só o meu impasse ou o impasse da nossa cultura. Mas, olhando para o mundo,continuo me perguntando se é possível ouvir o outro argumentando, deixar-se convencer sem renunciar à minha vontade de domínio. A esta renúncia eu chamo, talvez não apropriadamente, de "violência" sobre si.A pesar disso, minha intuição me fala de outros horizontes que ainda não enxergo.

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